terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

domingo, 6 de fevereiro de 2011

PARA NÃO ESQUECER JAMAIS.




PASQUIM apresenta: PAULO FRANCIS NU E CRU

Editora Codecri - Rio de Janeiro – 1976

Dedicatória:

"Ao Jaguar, sem o qual O PASQUIM não existiria, mas que não é responsável pela minha raiva e melancolia."


Prefácio:

"Este livro é feito da minha correspondência de Nova York para O PASQUIM, entre junho de 1971 e dezembro de 1975. Uma seleção, naturalmente, do que achei que valia, entre a superficialidade e simplificação do jornalismo e o que a censura deixou que saísse. Apesar disso, não me envergonho e retifico nada do que disse. Sempre escrevi rápido, pensei rápido e vivi rápido (infelizmente morreu rápido). Sou o que está aí. As correções foram só de estilo, um ou outro número e titicas similares. Omiti matérias específicas sobre Vietnam e Watergate (mencionados às pampas, apesar disso). Não é modéstia. Fui o primeiro jornalista brasileiro não só a discutir a sério a guerra do Vietnam como a prever a vitória dos vitoriosos. E em Watergate previ em março de 1973 a queda de Nixon, o que ninguém ainda tinha feito na imprensa americana, embora a vontade fosse grande. Relendo os ditos cujos, porém, achei-os chatos e papel de embrulho do peixe de ontem. E chega: em 1972, falando nisso, escrevi um livro onde deixava clara minha posição (e previsões) sobre Vietnam e Watergate. Chama-se Nixon X McGovern: as Duas Américas (Francisco Alves). Aos interessados,acrescento que em 1972 Watergate era apenas um brilho no olhar de dois jornalistas do Washington Post, Bob Woodward e Carl Bernstein. Melhor companhia inexiste. Mas o livro é PASQUIM. Espero. Mantive ao máximo o tom de deboche do jornal, a melhor e maior contribuição que deu ao Brasil, que só no deboche se agüenta, desde 1964. É isso aí."


P.F.

1 INUTILIDADES

EM DEFESA DOS EUA



Agora que as cravelhas americanas estão caindo em alguns lugares, nenhum muito importante, falando nisso, até publicações conservadoras como The Economist acusam os EUA de uma política externa inepta e destrambelhada.
Peço vênia para discordar. Nunca houve uma política externa que funcionasse tanto como a americana, quando consideramos, a bem da verdade e da justiça, os handicaps que tem de enfrentar.
Considerem: durante 23 anos, de 1949 a 1972, Washington conseguiu a 2/3 do mundo que a ilhota de Taiwan era A CHINA, enquanto que a China propriamente dita não passava de ilusão de ótica, sendo populada por 800 milhões de energúmenos cuja única ocupação consistia em correr de um lado a outro do imenso e desperdiçado território, sem Beba Coca-Cola discernível nas ruas, brandindo um livrinho vermelho.
Se a China desapareceu 23 anos, o que dizer do inflacionamento da ilha de Cuba, que, entre 1959 e 1963, ameaçou militarmente o nosso champã, inclusive pretendendo converter Búzios em campo de colheita de cana, quando se tornaria insuportavelmente shangai? É com nostalgia sentida que recordo as manchetes de “O GLOBO” e outros diários democráticos em nossa pátria sobre o “barbudo tirânico” e a “cubanização do hemisfério”. Olhem o mapa e vejam o perigo de que escapamos graças à fiel praxis da máxima o preço da liberdade é a eterna vigilância.
E há a infinita criatividade americana em fase de circunstâncias extremamente adversas. Frustrada na tentativa humanitária de convencer a amarelos, marrons, negros, latinos e outras pessoas de cor, cuja tonalidade específica não me tenha ocorrido (ficam aqui, antecipadamente, minhas desculpas aos omitidos), a enfiarem anticoncepcionais nas respectivas mulheres, Washington, temendo que do jeito que os natios iam procriando em breve os americanos médios não poderiam mais comer 50 quilos de carne de boi ao ano, Washington começou a resolver o problema de maneira pronta e cirúrgica. Um bom exemplo é o controle da natalidade na Indochina, menos 1 milhão de cambojanos de um total de 7 em 5 anos de jornadas, e milhões, ninguém sabe ao certo quantos, de outra variedade de amarelos, os chamados vietnamitas. Ingredientes: TNT, herbicidas, pesticidas e napalm. Há ainda incontáveis mutilados, esfomeados e envenenados na região que se continuam vivos, por assim dizer, dificilmente poderão procriar, aumentando o excesso populacional. E demonstrando que não há hard feelings, nenhuma animosidade do povo americano na sua missão civilizadora. Washington, em bom tempo, importou alguns milhares de órfãos, tornados tais pelos ingredientes acima referidos, como souvenirs. Em breve, nas escolas públicas locais, serão apedrejados pelas mamães e papais das crianças brancas, mas com a experiência que adquiriram em escapar de bombas no Vietnam, o que é um paralelepípedo a mais ou a menos, sem falar do fato incontestável que estarão vivendo em muito melhores condições, pois, sob a chuva de pedras, terão o conforto de ler editoriais liberalíssimos no “New York Times” em defesa dos seus direitos de estudar, intitulados invariavelmente Irracionalismo em... segue-se o nome da cidade, já tendo sido sugerido que o “Times”, aderindo à nossa era eminentemente visual, coloque ao lado da palavra Irracionalismo o mapa completo dos EUA.

Washington é pragmática. O que é bom para o Vietnã nem sempre funciona em toda parte. Assim é que houve enorme alegria em Washington, traduzida na frase do então Presidente Lyndon Johnson, “uma grande vitória do mundo livre” quando o governo marron da Indonésia, em 1965, eliminou 1 milhão de marrons da lista dos aspirantes à comida, revelando uma iniciativa insuspeitada da parte de marrons, principalmente porque os marrons “dispensados” pertenciam às hostes do principal inimigo da humanidade e preocupação suprema de Washington, a “conspiração comunista internacional”, ora, sem sede fixa (já se baseou em Moscou, Pequim, Praga e em Havana), pois demônios contam entre as artes que dominam a capacidade de desaparecer temporariamente da nossa vista. Mas estão sempre conosco. Eles se infiltram, eles se mascaram.

Há também a alternativa aplicada nos marrons da Índia. Essa, sutil e rotineira. A fim de produzir uma agricultura de subsistência, já que dão à luz com maior assiduidade que o gado que adoram, uma bárbara se pitoresca religião, imaginem só um deus que faz “mu”, os marrons lá precisam de um dos produtos do gênio americano, os fertilizantes. Sempre disposta a auxiliar os menos favorecidos (vide parágrafo acima sobre os órfãos vietnamitas), Washington despachou para lá a Standard Oil da Califórnia (ou será de Indiana? Não tem importância, mudam os nomes apenas. “Uma rosa se chamada por outro nome”, como diz o mais famoso poeta daquela deliciosa ilhota que os EUA administram, a Inglaterra, permitindo generosamente aos ilhéus a ilusão de que se autogovernam), de propriedade do filantropo Nelson Rockfeller, da fundação do mesmo nome. A líder marrom local achou os preços dos fertilizantes um tanto caros. Considerando que o freguês tem sempre razão, a Standard Oil não insistiu. Washington, porém, acredita que às vezes um pouco de energia é necessária no trato dos nativos, para o bem deles próprios, e suspendeu créditos (empréstimos, não doações. A caridade é um estímulo à preguiça) até que a líder marrom aceitasse os preços da Standard Oil. Isso feito, os créditos e os fertilizantes foram prontamente fornecidos. Tudo OK. O Calcutá!
Washington sente-se profundamente incompreendida pelos que beneficia e protege. Um exemplo é o Chile. O país, em plena liberdade, coisa a que os latinos não estão habituados, admitindo eles próprios que quem nunca comeu melado quando come se lambuza, começou a adotar as sinistras práticas ditadas pela “conspiração comunista internacional”, encampando diversas empresas dos EUA, o que, evidentemente, provocou o caos na economia chilena. No afã de ensinar uma lição proveitosa aos latinos, Washington usou a influência que tem no chamado Banco Mundial e outras chamadas instituições internacionais de crédito, cortando completamente empréstimos ao governo responsável pelo crime contra a economia chilena, e, apertando o parafuso, enviou em masse funcionários da maior agência filantrópica dos EUA, a CIA, a Havana, digo, a Santiago, os nomes latinos são fáceis de confundir, e esses abnegados distribuíram 13 milhões de dólares suados dos contribuintes americanos às forças democráticas locais, não lhes cobrando recibo ou imposto de renda, como é típico de Washington, porque a generosidade em alguns casos rende mais proventos a longo prazo do que rigores fiscais. A conseqüência disso foi a emergência do governo Pinochet, que rapidamente eliminou todos os focos de subversão, restabelecendo a democracia, que será implantada com todos os formalismos de praxe (formal trappings) nos próximos 40 ou 50 anos, a julgar pelo predecessor e êmulo de Pinochet, o generalíssimo Franco da Espanha que, há 37 anos, apesar dele próprio já estar queimando óleo 70, aos 81 anos de idade, impede que o povo espanhol, irresponsavelmente, seja seduzido pelas blandícias da “conspiração comunista internacional”.
Acredito que os exemplos supracitados sejam suficientes para demonstrar os êxitos da política externa dos EUA e o espírito que a anima. Eu poderia citar outros, mas me contenho porque penso no preço do papel, que o Brasil importa a dólares, e não quero pesar sobre o PASQUIM, que colabora com as nossas importações, aceitando a desvalorização mensal do cruzeiro em fase do dólar, o que estimula as exportações americanas para nossa pátria e, garantindo dest’arte a riqueza dos EUA, de tabela damos nossa modesta contribuição à segurança e integridade do Mundo Livre.

"ARTE" NA RUA # 11

TIRINHA 120

sábado, 5 de fevereiro de 2011

AO MESTRE COM CARINHO.

Grande Paulo Francis, aliás, Franz Paulo Heilborn, morreu na manhã de 4 de fevereiro de 1997, no duplex em que morava com a mulher, Sonia Nolasco, na Dag Hammarskjöld Plaza, vizinha da ONU, em Manhattan. Sofreu um enfarte fulminante.
O tempo dilui tudo rapidamente, 14 anos sem sua inteligência é MUITO tempo.


"ARTE" NA RUA # 10

TIRINHA 119

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

"ARTE" NA RUA # 9

TIRINHA 118

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

"ARTE" NA RUA # 8

TIRINHA 117

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

"ARTE" NA RUA # 7

TIRINHA 116

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

NÃO EXISTE FELICIDADE FÁCIL.

Li essa entrevista na Folha de SP/Ilustrada e gostei muito. Já tinha visto o filme "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?", mas nunca me importei com a peça, quanto mais para o autor. Soi una besta humana.
Segue texto e entrevista.



RAIO-X
EDWARD ALBEE


VIDA
Nasceu em 12 de março de 1928, em Washington D.C., Estados Unidos

OBRA
Escreveu mais de 30 peças, dentre as quais "Quem Tem Medo de Virgínia Woolf", em 1962 e "A Cabra Ou Quem é Sylvia?", em 2002

PRÊMIOS
Ganhou três vezes o Tony Awards (por "Quem Tem Medo...", "A Cabra..." e pelo conjunto da obra), e três vezes o Pulitzer (por "Seascape", "Um Equilíbrio Delicado" e "Três Mulheres Altas")



"Senhor Albee" (ou: teatro não é fonte de felicidade)

O americano Edward Albee, autor de "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?", tem nova peça montada em São Paulo; ganhador de três prêmios Tony e três Pulitzer, ele defende que o teatro deve ser antes um ato de agressão do que uma fonte de felicidade

LUCAS NEVES
DE SÃO PAULO


Não venha falar de sonho americano para Edward Albee. Aos 82, o dramaturgo ainda prefere perturbar o sono americano com peças que desconstroem a felicidade conjugal de fachada, prospectam sem pudores as pulsões sexuais de gente comum e fazem personagens contracenar com a morte -seja a perspectiva dela a pairar sobre a cena, seja a dita cuja encarnada.
As opções temáticas fazem do teatro de Albee, há mais de 50 anos, um show de pirofagia em que quase tudo é permitido. Para atiçar chamas, vale desde um arsenal de imagens que oscilam entre o sádico e o grotesco (circuncisão reversa, mastectomia voluntária, estupro anal...) até reminiscências da juventude, marcada por um relacionamento frio com os pais adotivos.
Não espanta que as mães de sua lavra sejam quase sempre figuras odiosas. No Brasil, suas obras são montadas desde o começo dos anos 60. Em 1995, José Possi Neto dirigiu encenação bem recebida de "Três Mulheres Altas". Quatro anos anos depois, Walmor Chagas e Tônia Carrero buscavam "Um Equilíbrio Delicado" -estado que o casal beligerante vivido por Marieta Severo e Marco Nanini em "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" (2000) nem sonharia alcançar.
Depois de José Wilker se apaixonar por um ruminante em "A Cabra Ou Quem É Sylvia?" (2008), Karin Rodrigues interpreta a personagem-título de "A Senhora de Dubuque", em cartaz a partir do dia 29 de janeiro, no Sesc Pinheiros, em São Paulo. A morte mais uma vez tem os refletores voltados para si. E nada mais diremos aqui.
Em entrevista por telefone à Folha, Albee advoga por um teatro que configure "um ato de agressão" e não se acanhe em fazer as "perguntas difíceis", ainda que isso irrite grande parte do público -que busca "um entretenimento seguro e amigável".
Para ele, a arte "não tem de nos deixar felizes, mas sim mais conscientes de nossos sentimentos e valores". Valores que, no teatro ideal imaginado pelo americano, devem ser postos em xeque, jamais reafirmados.
Albee fala também da influência de sua biografia sobre a ficção que ele produz e da frágil formação intelectual do espectador médio de teatro na América de hoje.
Leia a seguir os principais trechos da conversa com o escritor, ganhador de três prêmios Pulitzer e igual número de Tonys:

Folha - A morte é uma presença marcante e até assume forma humana em peças de sua autoria, como "Três Mulheres Altas" e "A Senhora de Dubuque". Por que o senhor acredita que ela seja um mote tão forte para o teatro?
Edward Albee - Só há duas coisas que realmente importam. Os dois grandes eventos na vida de qualquer pessoa são seu nascimento e sua morte. E então você escreve sobre esse parêntese, sobre tudo o que acontece nesse intervalo. Você não pode escrever sobre seu nascimento porque não se lembra dele.
Mas pode escrever sobre a morte, porque obviamente não tem memórias dela, mas espera por isso. Há vários tipos de morte. Muitas das minhas peças são sobre pessoas que estão vivas, mas morreram emocional e intelectualmente muito tempo atrás. Você pode estar morto no íntimo e ainda vivo.

As notícias que nos chegam sobre a cena americana incluem a estreia de uma adaptação musical de "Homem-Aranha" orçada em US$ 65 milhões (R$ 109,8 mi) e um número crescente de estrelas hollywoodianas buscando na Broadway legitimação. Que margem esse quadro deixa para provocação e tomada de riscos?
A maioria das pessoas quer um entretenimento seguro e amigável. Não desejam que seja um ato de agressão. E quase toda arte, em seu melhor, é um ato de agressão contra o status quo. Ou seja: está ali para levantar questões, não para fornecer respostas fáceis, simples.
Mas se você faz perguntas difíceis, irrita muita gente. Essa é a função da arte, entretanto. Se ela não lhe saca do conforto, não é arte. O problema é que boa parte das pessoas tem preguiça intelectual.

De que maneira a arte pode ser a um só tempo agressiva e divertida?
Atraente é uma palavra perigosa, significa que as pessoas vão gostar. O que a arte precisa é ser mobilizadora de nossa mente e de nossas emoções. Ela não tem de nos deixar felizes, mas sim mais conscientes de nossos valores. E deve nos levar a interrogar se estamos dando conta ou não de nossas responsabilidades. Não entendo como alguém pode querer ir ao teatro só para ver atores voando suspensos por fios [referência a "Homem-Aranha"]. Vá ao circo, então! O teatro deve mobilizar o intelecto e o olhar.

Como o sr. vê o jogo de forças entre o teatro que chama de comercial e o de vocação mais experimental, hoje, nos Estados Unidos?
Grande parte das obras que são produzidas com um olhar no lucro que voltará para o investidor tende a ser uma perda de tempo. Por outro lado, grande parte dos trabalhos feitos só de amor ao teatro, ainda que não seja rentável, costuma ter mais valor. Esses são feitos em teatros pequenos, não comerciais, geralmente com temporadas mais curtas do que a porcaria comercial.

E por que isso acontece?
Porque as pessoas não querem ser incomodadas quando vão ao teatro. Anseiam por ter seus valores reafirmados -se é que se chega a discutir valores em cena. Não esperam vê-los questionados. Não estão ali para ser perturbadas. Querem perder tempo e estão dispostas a gastar muito dinheiro para isso.

O sr. é, então, pessimista em relação ao futuro do teatro?
O único problema da democracia é que você tem o que quer, em vez daquilo que você deveria querer. Numa democracia, se você é bem educado, pode tentar alcançar aquilo que deveria querer. Mas tem de ser instruído para fazer a democracia funcionar e para querer um teatro que faça algo útil.
Quando eu ia à escola, tinha uma classe de formação cívica, em que aprendia como o governo trabalhava e o que significava um ato político. Não se ensina mais isso na América. Também tive aulas de música, literatura e artes visuais. Hoje, elas não são consideradas importantes. As preferências das plateias são ditadas pelo pouco que aprendem. Se o cardápio ensinado fosse mais amplo, a gama de interesses seria mais diversificada.

"Toda arte é reinvenção, não repetição"

Edward Albee defende uso de temas tabu, afirmando que se "vendidos como arte" são vistos de forma diferente

Dramaturgo também reclama de encenadores que tentam atenuar ou tornar mais "digestivo" o teor de seus trabalhos

DE SÃO PAULO

Nesta parte da entrevista, Edward Albee fala sobre sua preferência por temas tabu, nega o caráter autobiográfico de suas peças e critica a TV americana. A seguir, os principais trechos. (LUCAS NEVES)

Diante desse quadro, por que insiste em abordar temas tabu, como bestialismo (em "A Cabra"), mastectomia voluntária e circuncisão reversa (ambas em "Homelife")?
Porque isso representa o que sou, o que me interessa. É sobre isso que acredito que as pessoas deveriam refletir.

Mas esses temas ainda são capazes de ruborizar a plateia, tirá-la da zona de conforto?
As pessoas prestam atenção de um jeito diferente quando estão diante de algo que é vendido como arte.

Já foi sugerido que o sr. se vale fartamente de sua biografia para criar peças. As mães de seu teatro seriam variações da figura de sua mãe adotiva, com quem o sr. mantinha uma relação difícil. Como equilibra realidade e ficção?
Estou limitado pelas fronteiras da minha imaginação. Escrevo o que consigo imaginar. Mas não limito a minha escrita a fatos que tenham acontecido comigo, porque não penso ser um objeto teatral tão interessante assim. Me considero uma pessoa interessante, mas não um tema próprio para uma peça.

Qual a diferença entre ser uma coisa e a outra?
Para que a história de alguém se preste ao teatro, suas ações têm de fazer sentido em termos dramáticos, não apenas intelectuais. Senão você transforma uma vida chata numa peça idem. Não consigo imaginar uma peça muito boa sobre [o filósofo alemão] Immanuel Kant, por exemplo.

Em suas peças, surge com frequência um elemento "intruso", alguém que vem de fora do cenário principal para (às vezes à própria revelia) derrubar máscaras sociais, revelar hipocrisias. Como o jovem casal convidado pelos protagonistas de "Virginia Woolf", ou o par e a filha visitantes de "Um Equilíbrio Delicado". O inferno são os outros?
Dramaturgia se apoia em conflitos emocionais, físicos, psicológicos ou políticos. E se você tem um grupo de pessoas que se conhece bem, está muito feliz e não tem sobre o que falar, não há conflito. O que você tem em mãos nesse caso é televisão.

Mas não dizem que a televisão americana vive uma nova era de ouro, com enredos provocativos, personagens bem construídos?
Por "era de ouro", querem dizer um período muito rentável. Só vejo programas informativos, que possam me ensinar algo. Gosto daqueles que tratam de animais, ciência, o cérebro. A minha leitura também segue essa mesma inclinação.

E peças, o sr. lê?
Leio porque quero saber o que está acontecendo naquela história. Se vejo uma montagem sem antes ter lido o texto, não tenho a certeza de estar assistindo à peça que o dramaturgo imaginou.
Há uma hierarquia que deve ser respeitada, que determina que o texto venha antes, e a sua interpretação, depois. Essa deve apenas reforçar o que o autor concebeu.
Em duas ocasiões, senti que isso não estava acontecendo, e o resultado foi horrível. Mas não quero falar sobre isso. Você tem de ser forte para garantir que a sua visão é o que a plateia vai receber, porque às vezes tentam abrandá-la, facilitá-la, torná-la menos perturbadora, mais digestiva. Diretores às vezes fazem isso, seguindo comandos de quem está colocando dinheiro na produção.

O sr. dá aulas na Universidade de Houston. Como é o contato com grupos de jovens dramaturgos?
Ensino porque aprendo ao fazê-lo. Sou muito egoísta. Se não existisse essa via de mão dupla, não funcionaria para mim. Sempre digo aos alunos: "Escrevam a primeira peça de todos os tempos. Inventem a forma, a estrutura, a ideia". Toda arte é reinvenção, não repetição. Arte ruim é repetição. É simples assim.

"ARTE" NA RUA # 6

TIRINHA 115