quarta-feira, 6 de outubro de 2010

TEM O NOVO DO MASSIVE ATTACK?!

Teardrop falling
por Martim Vasques da Cunha


Assistimos Brad Mehldau no concerto de piano realizado pela TUCCA, na Sala São Paulo, um evento que, toda vez que o pianista norte-americano vem ao Brasil, é divulgado de última hora.
O que dizer? Mehldau é um dos poucos que podemos chamar de “virtuoso popular”. Sim, ele sabe tocar. Sim, ele sabe escolher seu repertório. E, sim, ele sabe improvisar – algo essencial para um pianista que, antes de tudo, pratica o jazz.
Contudo, confesso que, no início, temi pelo meu próprio gosto musical. Estaria eu errado? Mehldau é um virtuoso que pode cair na armadilha do cerebralismo, do toque seco no piano que soa a um timbre mecânico. Um romantismo cibernético que cai bem nos dias de hoje e nas gravações assépticas, mas que, ao vivo, causa um sabor agridoce.
Mas eis que, após ter tocado uma versão circular de Bittersweet Symphony, do Verve, e duas composições próprias, Brad Mehldau mostra a que veio com uma versão arrepiante de Teardrop, do Massive Attack.
Isso é o que pode ser chamado de ousadia: em uma sala de música erudita e sofisticada, um dos pianistas mais talentosos de uma arte que anda meio sorumbática em seu próprio páis (afinal, não temos mais os Oscar Petersons e os Bill Evans como antes) resolve recriar uma das canções mais bonitas do pop nos últimos anos – e que foi composta por uma dupla de música eletrônica.
Mehldau estendeu a estrutura de Teardrop até o limite, transformando-a em uma marcha fúnebre. Pode-se dizer que faz a mesma coisa em sua célebre recriação de Paranoid Android, do Radiohead; mas aqui não é mais tique ou estilo no piloto automático; é obsessão mesmo, o virtuoso levando as notas e os acordes ao extremo da desintegração, para depois recuperá-las de uma vez e voltar com o mesmo tema e a mesma estrutura anterior, agora carregados de um novo pathos.
Como se não bastasse, emendou com uma improvisação em cima de My Favourite Things, de Rodgers and Hammerstein, que fez os olhos deste resenhista lacrimejarem suavemente, porque trouxe memórias de uma infância que estava adormecida e que é sempre bom recuperar quando precisamos.
Este choque de repertórios provocado por Mehldau tem um propósito: Colocar, por exemplo, Cole Porter e Thom Yorke lado a lado seria um crime? Sua resposta é um claro “não”. O cancioneiro popular americano é amplo o suficiente para incorporar as mais variadas experimentações musicais. De certa forma, Porter era ousado com a estrutura da canção e Mehldau mostra que Yorke, Richard Ashcroft e Paul McCartney não deixam nada a dever aos grandes mestres da canção sofisticada. O pop se tornou standard.
O show terminou com Exit Music, do Radiohead, em um timbre a lá Robert Schumann, romântico, pesado. Brad Mehldau pode ser um músico considerado “excêntrico”, mas foi a sua imprevisibilidade que me fez lavar a alma, deixando-me aberto para qualquer nova lágrima que possa sair dos meus olhos.

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