terça-feira, 31 de agosto de 2010

SENSAIONAL!!!





O JORNALISTA CHAVEMANÍCO
Por Ramon Mello

Quem nunca se divertiu assistindo às trapalhadas e aventuras do Chaves e Chapolin, no meio da tarde? Pois foi essa paixão e admiração pelos seriados mexicanos que inspiraram o jornalista Pablo Kaschner a escrever o livro Chaves de um sucesso (Editora Senac Rio), em que conta histórias e curiosidades dos personagens que ultrapassaram barreiras e conquistaram o mundo.

“Não contavam com minha astúcia”, brinca o autor diante do famoso bordão.

Mas se engana quem pensa que o livro é uma síntese superficial dos programas. Existe sim um inevitável saudosismo dos anos 80 (que tem aflorado nos últimos anos), mas o trabalho é resultado de uma criteriosa pesquisa, que a princípio serviu de base para conclusão de sua monografia na faculdade de Rádio e TV, da UFRJ. Pablo oferece, em um texto leve e muito bem humorado, curiosidades, entrevistas e um ponto de vista crítico sobre um seriado que conquistou o Brasil e o mundo há mais de vinte anos.

Sim, o jornalista carioca, de apenas 25 anos, é um “chavemaníaco”! E a partir de hoje oficializa a homenagem aos personagens que passearam pela nossa infância e que, em muitos casos, ainda permanecem na fase adulta.

Conversei com o Pablo no café do Cinema Arteplex, em Botafogo. Cheguei com antecedência e, antes de iniciar a conversa, confundi um cinéfilo cabeludo com o autor... Ele é barbudo, cabeludo e torcedor do Flamengo – chegou feliz com a camisa do time, por conta da vitória, no dia anterior, contra o Madureira. Um papo tranqüilo com um escritor tímido, inteligente e extremamente bem humorado.

Click(IN)VERSOS – Pablo, como surgiu a idéia de escrever um livro sobre os seriados Chaves e Chapolin?

PABLO KASCHNER - Eu estava para concluir o curso de Rádio e TV, na UFRJ, e precisava escolher um tema para a monografia. Eu não gosto muito da linguagem acadêmica, sempre achei meio parada e difícil... Então resolvi escolher um tema que, tanto na forma quanto no conteúdo fossem leves, fugindo bastante do mundo acadêmico. Meu orientador da monografia, que é o projeto inicial do livro, falava que eu não poderia escrever tão informalmente, mas eu fui meio rebelde e com causa... (RISOS). Mas por fim consegui encontrar um meio termo para execução da pesquisa, depois pra transformar em livro eu não tive tanta dificuldade. Acrescentei o conteúdo sobre o Chapolin, porque a monografia foi somente sobre o Chaves.

Click(IN)VERSOS- Foi difícil encontrar um editora que apoiasse o seu projeto?

PABLO KASCHNER - Eu defendi a monografia, em seguida registrei e comecei a mandar para algumas editoras. Só que no dia que consegui uma editora, um livro sobre o mesmo tema foi lançado em São Paulo. Mas aí não desisti, estava disposto a defendê-lo. Várias pessoas me diziam que havia um apelo comercial grande, pois muita gente gosta do Chaves e do Chapolin...

Click(IN)VERSOS- A idéia do projeto é saudosista, uma tentativa de resgatar algo da sua infância, dos anos 80?

PABLO KASCHNER - Não. É verdade que está na moda essa fase anos 80 e as festas Ploc, mas não foi com essa intenção que escrevi. Claro que todo mundo tem uma ponta de saudosismo do que já passou, mas o intuito foi escrever sobre um assunto que eu gostava, entender o porquê desse sucesso e poder mostrar isso para as pessoas. É engraçado, pois, mesmo quem cresceu no meio de videogames, também gosta do seriado do Chaves, que é tosco e tem uma estética anos 70, simplória, que parece que você vai dar um peteleco no cenário e ele vai cair...

Click(IN)VERSOS- Quanto tempo você levou para concluir todo o trabalho, da monografia à publicação?

PABLO KASCHNER - Acho que demorei quase 3 anos, desde o final de 2003 que me dedico a esse projeto. Eu não consegui uma editora facilmente, ela desistiu por causa das outras publicações que já existiam sobre o tema e depois voltou atrás. Eu cheguei a ler o outro livro que foi lançando nessa época e notei que o tema não havia se esgotado e que a abordagem era completamente diferente da minha. Então continuei insistindo, mandando para outras editoras. Logo consegui outra, que foi importante para o livro – eles me deram o toque sobre acrescentar o estudo sobre o Chapolin, que até então não existia. Mas acabei fechando com uma terceira editora, a Senac Rio, por questões comerciais.

Click(IN)VERSOS – O que foi mais difícil na sua pesquisa?

PABLO KASCHNER - Acho que o mais difícil foi falar com o Bolaños, que é o criador da série e faz o Chaves. Hoje ele tem 78 anos. Demorou quase seis meses só para a assessora dele responder o meu e-mail. Foi um longo processo. Aconteceu uma cúpula de mídia em 2004 e eu fazia estágio numa produtora, então pude participar do evento. Lá conheci o pessoal da Televisa (os exibidores do seriado) que passaram o e-mail da filha do Bolaños, que passou para a assessora dele e que depois repassou o e-mail para ele. O Bolaños é muito querido no México, o apelido dele lá é Chesperito – que significa pequeno Shakespeare. Mas há intelectuais que o criticam, acham que o México não precisa ser retratado pela pobreza...

Click(IN)VERSOS- Já entregou o livro para o Bolaños?

PABLO KASCHNER - Não, já enviei um e-mail para a assessora dele pedindo o endereço, mas ela ainda não respondeu. Mas já foi divulgado que ele virá ao Brasil ainda esse ano, se ele vier eu vou à caça!

Click(IN)VERSOS- Como foi entrevistar os dubladores da série?

PABLO KASCHNER - Eu os entrevistei em um encontro de “Chavesmaníacos”, há mais de um ano. Foi ótimo. Eles foram super simpáticos, fiz um bate-papo com eles. A Cecília Lemes, que faz a Chiquinha, e o Nelson Machado, que faz o Quico, são de São Paulo. Só tem um que mora no Rio, que é o Carlos Seidli, que faz o Seu Madruga. Uma vez eu pedi que ele gravasse o recado da minha secretária eletrônica, foi engraçado... Ah, teve o caso do Gustavo que é um fã que virou dublador, fez o teste para o desenho e agora dubla o Nhonho.

Click(IN)VERSOS – Qual foi a informação mais curiosa que você descobriu?

PABLO KASCHNER - O carteiro Jaiminho, um velhinho que fala o bordão “Sou de Tangamandapio”, foi o mais curioso. Eu descobri que essa cidade realmente existe. E perto dessa cidade tem outra chamada San Ramon, fazendo referência ao ator Ramón Valdez, o Seu Madruga...

Click(IN)VERSOS- Por que um seriado consegue arrastar uma legião de fãs – crianças e adultos – durante décadas, mesmo as pessoas sabendo que a história é sempre a mesma?

PABLO KASCHNER -Tem a estratégia da repetição, as pessoas gostam de ver aquilo que elas já conhecem. No livro eu até citei o Umberto Eco (teórico de comunicação), sobre a teoria do espelho: o espectador vê aquilo e quando sabe que vai acontecer o que ele estava esperando, se sente satisfeito... Mas eu ainda me surpreendo com os episódios, o roteiro é simples, mas é ótimo. Na verdade, não existe uma fórmula de bolo para explicar o sucesso do Chaves. Se existisse, as pessoas já teriam copiado. Mas no livro eu explico direitinho....(RISOS).

Click(IN)VERSOS- Em quantos países o seriado ainda é exibido?

PABLO KASCHNER - Eu não tenho o número exato. Só na América Latina são 17 países: Brasil, Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Equador, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru, Porto Rico, República Dominicana, Uruguai... Mas isso varia também. Às vezes, o programa sai do ar tanto no México como no Brasil. O Sílvio Santos sempre tira do ar, acho que nem ele sabe o que o tem na programação dele...(RISOS) Mas no Brasil ele é exibido desde 84, em agosto faz 23 anos. E no México ele começou em 71.

Click(IN)VERSOS- Por que o Seu Madruga é personagem considerado cult no Brasil?

PABLO KASCHNER -Talvez pelo lado malandro dele, que lembra o “jeitinho brasileiro”. O fato de não gostar de trabalhar, o aluguel atrasado há 14 meses e também a interpretação que ele faz que é bastante próxima.

Click(IN)VERSOS – Por que as pessoas se identificam tanto com o Chapolin, um anti-herói, um personagem tão avesso?

PABLO KASCHNER - Acho que porque ele é mais humano. Eu até falo isso no livro, o que adianta ser valente se você é indestrutível? Assim é fácil! O Chapolin não, ele é fraco, medroso, mulherengo, é tudo que não se espera de um herói. É contraditório mesmo, pois sentindo medo ele consegue reforçar o heroísmo dele. Ele é humano, as pessoas se identificam porque também têm defeitos.

Click(IN)VERSOS- Quais são os personagens que você mais gosta?

PABLO KASCHNER - Eu gosto muito do Seu Madruga (RISOS) e do Quico. Do Seu Madruga por causa do ator (Ramón Valdez), que eu achava excelente, e do Quico é uma certa identificação: sou filho único, de mãe viúva, sou mimado, quando era criança não gostava de perder as brincadeiras...(RISOS) Mas hoje em dia eu não sou mais assim não, tá! Ah, eu fui criado numa vila também.

Click(IN)VERSOS – Você escreve ficção?

PABLO KASCHNER - Sim, eu escrevo contos. Já tenho algumas idéias, mas no momento estou voltado para esse projeto. O primeiro livro que escrevi foi um diário que fiz durante uma viagem à Europa, aos 7 anos, a pedido da minha avó. Esse é um projeto que tenho vontade de publicar. Mas eu já lancei um livro de contos e crônicas cômicos, em parceria com outros autores. Chama-se Humor, tô vivo! (RISOS). Foi uma produção independente feita por sete autores, a maioria mulheres...

Click(IN)VERSOS – Você também escreve num blog de humor chamado Mico na Rede. Como é isso?

PABLO KASCHNER - É um blog feito por cinco amigos, nem sempre bem humorados...(RISOS) A maioria é da área de comunicação, mas tem um “errado” que estuda Direito. Faz tempo que estou atolado com o livro e em falta com eles, mas estou voltando!

Click(IN)VERSOS – Você pretende tentar publicar em outros países?

PABLO KASCHNER - Eu ainda não sondei isso com a editora, mas mercado não falta! Pelo menos na América Latina... Acho que é só revisar o livro e fazer as adaptações necessárias. Mas no Brasil o livro já está à venda, a distribuição é nacional!

Click(IN)VERSOS – E o recado que você deixaria para galera?

PABLO KASCHNER -Gostaria que lessem o livro! É um trabalho com humor, mas tem seriedade na pesquisa. Eu costumo dizer que, para quem gosta de Chaves, é um prato cheio. E considerando que Chaves sempre está faminto, nada melhor que um prato cheio... (RISOS)



Livro: Seu Madruga, Vila e Obra
por Marco Antonio Bart

Em seu livro Groucho-marxismo, o filósofo anarquista Bob Black prega, sem rodeios, que “ninguém jamais deveria trabalhar (…) Para parar de sofrer, precisamos parar de trabalhar”. Seu Madruga, o desempregado crônico que garante de forma involuntariamente tragicômica a alegria – e o pathos – da vila onde mora o garoto Chaves, nunca ouviu falar de Black. Mas certamente gostaria de seus escritos.

A inusitada ponte entre o subversivo e o malandro mexicano é uma das conclusões a que Pablo Kaschner chega em seu livro “Seu Madruga – Vila e Obra” (Editora Mirabolante). O autor, carioca de 28 anos que já editou outro livro (”Chaves de um sucesso”) sobre o humorístico mexicano exibido pelo SBT, compôs menos uma biografia do que um “livro-homenagem” sobre o personagem, tido como o mais popular do programa entre os fãs brasileiros (e não só eles). Para Kaschner, Madruga, criação do ator Ramón Valdés (1923-1988), desperta tanta identificação por incorporar (com sua aversão ao trabalho, as dívidas eternas, as humilhações e o humor diante das dificuldades) um pouco do caráter do brasileiro típico.

– Mesmo mexicano, Madruga tem o famoso jeitinho brasileiro – constata o autor, diplomado em rádio e TV. – Dos personagens do Chaves, ele é o mais maroto, o que dá voltas nos outros, o mais politicamente incorreto. Basta andar pelas ruas das cidades brasileiras e é possível encontrar sósias do Seu Madruga em todo lugar.

Apesar de não ter um caráter de ampla pesquisa biográfica, “Vila e Obra” traz muita informação e curiosidades sobre Valdés e seu mais famoso personagem, tudo em tom muito bem humorado. Dividido em 14 capítulos (um para cada mês de aluguel que Madruga deve ao Seu Barriga, dívida que nunca será saldada), o volume mostra que Valdés já era um ator de carreira consolidada ao ser convidado para entrar em “El Chavo del Ocho” (nome original do programa Chaves) em 1971.

Madruga, originalmente chamado apenas Don Ramón, era parecido em tudo com o próprio Valdés. A única recomendação que Roberto Gomes Bolaños (criador do programa e intérprete do próprio Chaves) deu ao ator era que Valdés “fosse ele mesmo”. E, confirma Kaschner, através de depoimentos dos filhos do ator, que Valdés realmente se vestia como Madruga (jeans surrados, camisetas básicas) e repetia diante da câmera frases de seu vocabulário cotidiano.

Para o autor, a preguiça e a vocação para o ócio de Madruga o tornaram um ícone latino-americano. Ou, como o próprio Kaschner brinca, “ladino-americano”:

– Ele agora é mais que um ícone pop. Nas ruas, há mais camisetas com o rosto do Madruga do que com a foto do Che Guevara – arrisca. – O interessante é que essa identificação superou um bloqueio histórico que os brasileiros tinham com a cultura mexicana, que aqui sempre foi sinônimo de dramalhão, de coisa brega. Costumo dizer que o Chaves conseguiu unificar a América Latina, algo que o (Hugo) Chavez não conseguiu.

Exibido pelo SBT desde 1983, Chaves é certamente um caso único de longevidade na TV brasileira, quiçá mundial. Desde sua estreia, o programa nunca deixou a grade da emissora, apesar do excesso de reprises (o canal de Silvio Santos recebeu seus últimos episódios inéditos em 1992!), sendo transmitido praticamente todos os dias da semana durante esses 27 anos.

Em 1990, chegou aos 36 pontos de audiência, superando a Rede Globo várias vezes, apesar das tresloucadas trocas de horário. A assessoria de imprensa do SBT informa que agora, exibido apenas aos sábados (às 6h e 12h45) e aos domingos (das 9h às 11h), o seriado ainda atinge 7 pontos de média. Mesmo assim, sabe se lá quando você estará lendo esse texto, verifique na grade do SBT para ter certeza dos horários de exibição do programa.

– O brasileiro se mobiliza por poucas coisas. O Chaves é uma delas – conclui Pablo Kaschner.

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Marco Antonio Bart (@BartBarbosa) é jornalista e assina o blog Telhado de Vidro

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